quinta-feira, 29 de abril de 2010




cremação

antigamente, quando lepra não tinha cura
incineravam-se pessoas vivas
hoje, sinto-me assim: no fim; sem
alternativas
olhei pra mim e só vi cinzas

Lúcia Gönczy

segunda-feira, 26 de abril de 2010

algumas vezes
sinto-me
penetrando nuvens
...
nestes momentos
há grande
turbulência

outras
minha alma
acalma
estanca-se
o sangue
a cena
o drama

a vida segue plana



Lúcia Gönczy



"É da liberdade destes ventos
que me faço.
Pássaro-meu corpo
(máquina de viver),
bebe o mel feroz do ar
nunca o sossego."



Olga Savary

se...

se teu coração desenhasse
sonhos
madrugadas proibidas
fossem memórias
quentes
invólucros naturais
de sensações palpáveis
notas que por si só
vibrassem
loucas línguas
salivassem
partículas heterogêneas
desprendessem
transmutassem
e entre si
amalgamassem...

...seria a química perfeita
meu amor!


Lúcia Gönczy

sexta-feira, 23 de abril de 2010








Eu gostaria de escrever como quem morre
mas minha mão é guiada pela pena
e meus braços criam asas de gaivotas
aí eu já não sou eu
sou a minha psicografia


Lúcia Gönczy
adoro quando diz meu nome
não importa a hora nem as flores
adoro quando tudo se disforma
e o grito sai mudo quase a queima roupa
adoro quando seu pensamento me toca
e triste me acha ausente
são nestes momentos, exatamente,
em que me acho mais presente

não negue: Você SENTE!


Lucia Gönczy
se não te procuro mais
é porque respeito o muro que você ergueu entre nós
muitas vezes tenho vontade de pular esse muro
pagar pra ver o que encontro do outro lado...
mas não me atrevo. sinto-me persona non grata
então recuo simplesmente como quem ainda não perdeu tudo
e permaneço com restos de uma certa dignidade

assim sobrevivo por instinto
e o que não faço, é por medo


Lúcia Gönczy
estarei contigo em cada olhar na multidão
em cada rosto conhecido ou anônimo
estarei em ti na expressão e no deslumbramento
e no ápice do momento quando as cortinas se abrirem

estarei contigo em cada beijo roubado
a cada afago carinhoso e sincero
estarei a teu lado em silêncio
ouvirás apenas meus suspiros

estarei em ti profundamente admirada
para onde me levares irei cantando
estarei em ti que sendo hum seremos tantos
e a nossa unidade preencherá qualquer vazio

estamos do lado de dentro
por isso
já não sinto sua falta

Lúcia Gönczy
nada mais faz sentido
escrever artérias medos mitos
que vá tudo pro infinito!
quero a palavra viva
línguas espumantes
entrecortados versos loucos
quero tudo pulsando
batendo pedras
cantando alto

Lúcia Gönczy/2008







Poemeu



acordar os olhos da manhã

e como quem nada quer

desejar somente teus raios de sol

a embriagar os meus




Lúcia Gönczy /2008

segunda-feira, 19 de abril de 2010





se te dou o meu silêncio
não é por falta de palavras
mas pelo excesso que elas causam
tentando explicar meu coração

Lúcia Gönczy



ciclo

então ficamos assim:
eu, areia
você, escrito em mim
sobre nós, uma flor violeta
e tudo + jaz...

como deveria.


Lúcia Gönczy



Meu porto e abrigo
Terra firme
Pisar e repisar
Amassar todo barro
Possível
Necessário
Depois
Desfazer o não feito
Deslizar
Puerilmente nos sonhos
Concordar
Confortar
Compreender
Se atirar sem noção
Do abismo
E querer tudo novamente
E refazer o já feito
Sem arrependimentos
Nem tristezas
No coração só uma chaga
Aquela mordaça
Indestrutível
De quando me calo
Para te proteger
Do medo



Lúcia Gönczy







quarta-feira, 14 de abril de 2010

























"Fiz a escalada da montanha da vida, removendo pedras e plantando flores"

(Cora Coralina)

"NUNCA HIPOTEQUEI MINHA ALMA NEM MEU CORPO.
TUDO QUE CONSEGUI NA VIDA FOI COM MUITO
TRABALHO, MUITA LUTA E MUITAS
LÁGRIMAS(OCULTAS)..."

Lúcia Gönczy
À flor da pele


Percebo
seu desalento
que aos poucos
sorve o meu ser

E olho
com olhos de lince
o gato
que existe em você

O peixe
deixo pra ceia
e cerceio
a cerca que anseias

Que tens de ser
do meu ser


Lúcia Gönczy
O SONO DAS ROSAS


a cidade não dorme
no entanto, é preciso ninar o Poema

as pedras transpiram liberdade
os sonhos vagam na noite
poetas espalham-se feito
pólen no vento

e as luzes, nem sempre da ribalta,
madrugada afora chovem cascalhos
cheios de silêncios

o Poeta finge adormecer
cerrando as janelas de sua alma
que por dentro da retina faíscam vida
também silenciosas
no coração pulsante da Avenida
para que, enfim,
descansem as Rosas


Lúcia Gönczy

domingo, 11 de abril de 2010

Madrugada


Nem sempre tarda
o bem que nos importa

A porta, é brecha
Fresta aberta
por onde navegam
sonhos

Além disso, há o inabitável
de cada um
[sozinho]

A chave gira a mão
Que aperta a maçaneta

Abro, entro, posto-me
Qualquer canto agora
é só um canto
enquanto à espera

Demoras...
carrego meu olhar no seu
e longe, detenho-me no fundo

[idealizo]



Lúcia Gönczy

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Nada de perder a fome nem o sono
[o sol brilha impreterível]

Nada daquela dor no peito
[arder até o fim - esmiuçar as cicatrizes]

Nada de decepção
[a entrega consentiu-se]

Nada de cobranças...
[foi o preço do apego]



Lúcia Gönczy
Remate


sinto-me tão plena
que me espanto tamanha euforia
de estar só em só alegria
a observar-te no meu encalço

o que me faz extremada de gozos
ver-te verter que te apareças
escrita, falada ou muda
a qualquer hora do tempo

e na paisagem interior,
impossível transgressora
amá-lo mais do que possa
até virar-te pelo avesso

entretanto foi uma fábula
tudo que vivemos
anéis sem aro sem vidro sem brilho
deixemos assim simplesmente

ainda que estamos íntegros
nem cortes nem cicatrizes
façamos como nos filmes:
final feliz, The End.


Lúcia Gönczy
cada um expurga
sua dor
como pode
A minha
é sangrar
através
das palavras


Lúcia Gönczy
Trajetória

não quero a recompensa
dos reconhecimentos
[póstumos]
quero o aqui e agora
o instante, o ato
as coisas que fragmentam
como a fragilidade das borboletas
e as pontes que reconstruo
com a força de um leão
[a cada momento]
sem olhar para trás

Lúcia Gönczy



quarta-feira, 7 de abril de 2010

Carta pra ninguém [III]


Amanhã deveria ser um dia comum, cinza, chuvoso,
como tem sido os últimos dias dela, inclusive os de Sol.
Banal, rotineiro, se não fosse o problema de passar naquela rua...
Sim, aquela da tinta, lembra-se?
Ela não entende por que é obrigada a voltar aos mesmos lugares;
Martírio! Tudo é ele o tempo todo: infrações, multas, motores...
Ter de encarar isso é barra; sente-se fragilizada diante das coincidências e,
impotente, por não poder evitá-las; simplesmente tem de continuar
vivendo...passando...enfrentando a fera, sua dor e seus fantasmas.
Então se programa: acordar cedo, escovar dentes, pentear macaco;
durante o processo a cabeça não pára: não pensar não pensar não pensar... será possível?
Se quanto mais se esforça mais se lembra?!...loucura! Sua cabeça é uma usina nuclear no amanhã que,
de alguma forma, será e não será. Ela passará por ali, inevitavelmente, e já sente de antemão o que irá sentir:
um frio louco por dentro; aquele vazio latejando o silêncio do celular.
Dorme pouco...seu sono é nervoso; fragmentado...sem ele tudo nela é oco; mas, mesmo assim, amanhece
e não dá outra: maktub conforme "ontem". Os sintomas de frio, ausência, saudade e dor eram os mesmos;
(talvez mais acentuados pela ansiedade...)
Entretanto não vacilou. Resgatou na zona abissal do seu íntimo os últimos resquícios de dignidade,
jogou "agua na cara" e foi dar sua veia a uma estranha.
Sair no escuro... logo ela que acha esquisito dizer bom dia quando ainda tem lua... Por sorte,
todos bichos papões que conhece a habitam; está acostumada. Aprendeu a lidar com eles utilizando
estratégia maquiavélica, tipo: melhor ter os inimigos por perto... Desta forma, acreditando, vestiu coragem e saiu:-
Liberdade, Sé, Pátio do Colégio...ai que bom; chegou "bem" na Boa vista, mesmo tendo
ultrapassado 2 sinais vermelhos; quanto mais passava, maiores alegrias, também maiores mágoas.
Com certeza, o carro se auto conduziu , porque ela que não queria pensar, olhar,
sentir e planejou escapar ilesa, se pegou desesperada a buscar nas ruas, nas casas,
nos ônibus e até nas primas, alguma lembrança boa e eram todas tão boas que embarcou na viagem;
Porém, quando você se encontra assim, sob efeito tóxico da paixão, costuma entrar naquele surto psicótico (psicoamorótico)
e, portanto, ela o via em toda parte; mas pirar, pirou mesmo na Praça da Sé. Ah...a Praça da Sé!!!...
Embora fosse dia, era noite; tão noite quanto infinitas 19 horas...tão clara quanto seus faróis. Era lá que ela carregava
seu olhar no dele...E aquele semáforo da curvinha, então?... Fechava sempre na hora certa para se beijarem.
Porra, como ela gostava destes momentos! Mas hoje, explicavelmente, ele ficou vermelho e ela sozinha.
Sem seu amor, sua boca, sem nenhum de seus bichinhos...
Foi aí que se deu conta: Na real, quem estava no vermelho, há tempos, não era o semáforo...
Caiu do sonho. Cabisbaixa, com o rabo entre as pernas, acordou pra vida, mas antes, se prometeu:
Com ela, ele não vai mais... Da próxima vez, sai de casa sem cabeça.


Lúcia Gönczy